Você está visualizando atualmente Planejamento na crise ditará o cenário do varejo na retomada

Planejamento na crise ditará o cenário do varejo na retomada

A maneira como as empresas do varejo se comportarem durante a recessão será decisiva para a definição do cenário pós-crise. Aquelas que se prepararem para a retomada, adotando as medidas necessárias, podem sair da situação melhor do que quando a instabilidade econômica começou. Para as que não fizerem o dever de casa, no entanto, a tendência é de perder mercado.

"No momento de recessão, as vantagens competitivas que as grandes companhias têm sobre as pequenas e médias diminuem muito. Portanto, é a hora de 'ajustar' a máquina e ganhar fôlego para a relargada", diz o sócio da consultoria Enéas Pestana & Associados, Sandro Benelli. Segundo ele, esse quadro gera inclusive oportunidades grandes de ganho de mercado.

O professor do Núcleo de Estudos e Negócios do Varejo da ESPM, Roberto Nascimento, concorda: "Se alguém perde espaço outro tem que ocupar. Então, a empresa que identifica oportunidades nesse cenário que estamos passando tem uma grande chance de ganhar market-share. Efetivamente vemos alguns players do varejo ganhando mercado."

Apesar da oportunidade que o momento traz – até mesmo para as empresas menores -, a necessidade de adotar estratégias voltadas ao aperfeiçoamento da operação, vulgo, redução de despesas e aumento da rentabilidade, é fundamental.

Isso porque, na visão do presidente do Instituto Brasileiro de Executivos do Varejo e Mercado de Consumo (Ibevar), Claudio Felisoni, a tendência, na realidade, é de uma maior consolidação. "Durante a crise os ativos ficam muito baratos, então, sem dúvida, há movimentos de consolidação. Quando a recessão acabar, o varejo provavelmente estará mais concentrado que antes", diz. Em outras palavras, as empresas que não se adequarem as demandas impostas pelo cenário recessivo, e não se movimentarem no sentido de tornar a operação mais saudável, podem ser 'engolidas'.

Mão na massa

Apesar do diagnóstico aparentemente simples, as medidas necessárias para tornar a empresa mais eficiente nem sempre são fáceis de serem implementadas, e requerem, em geral, uma série de ações continuas. Segundo Benelli o intuito de todas elas deve ser um só: aumentar a margem e reduzir despesas. "A primeira coisa que se tem que fazer é ter certeza de que os processos estão otimizados. Segundo, só se deve investir quando tiver segurança de que o investimento vai dar um retorno acima do esperado. Terceiro, é preciso fazer uma análise minuciosa do tamanho do sortimento e se ele de fato está adequado para o público da varejista", afirma. O consultor completa que um mix inadequado tem um giro menor, o que reduz o caixa da empresa. "Ao reduzir o sortimento para o mínimo necessário se tem uma geração maior de caixa e uma economia com estoque."

Para Nascimento, outro ponto fundamental diz respeito a área de compras, que deve ser colocada em posição estratégica na empresa. "Tem uma expressão no varejo que diz que não se ganha pelas vendas, mas pela compra. Ou seja, através da boa negociação com o fornecedor", diz Nascimento. "A empresa tem que ter uma espécie de manual: quais são os fornecedores, condições comerciais, indicadores, mix de produtos. Em suma, uma espécie de cartilha que ajude na administração das compras", completa.

De acordo com ele, outra necessidade é a eliminação ao máximo dos desperdícios e a busca constante pela redução das despesas operacionais. "Tem que ver onde está perdendo dinheiro e eliminar tudo que não agregue valor", diz.

'Sentar no caixa'

Sobre a diminuição dos gastos, Benelli, da Enéas Pestana & Associados, diz que uma estratégia que pode ser muito eficaz é o que ele chama de 'sentar no caixa'. A medida consiste basicamente em impor uma regra em que nenhum gasto pode sair da empresa sem a assinatura do presidente. "Só com isso se consegue reduzir as despesas em torno de 10% a 20%. Cria-se uma pressão psicológica que acaba inibindo os funcionários de gastarem", afirma o especialista, acrescentando que essa estratégia é empregada, normalmente, em empresas de grande porte. A respeito das dificuldades na execução ele é taxativo: "Dá muito trabalho, mas estamos em guerra".

Segundo ele, a política de redução de despesas tem que vir acompanhada de um controle orçamentário rígido. Para isso, o consultor diz que uma das alternativas é adotar o 'orçamento base zero'. "Essa é uma estratégia que defendemos muito. Na hora de definir o orçamento do período tem que partir do zero, ignorando o histórico de custos. Você faz esse orçamento envolvendo todas as áreas e todos são obrigados a justificar os custos de seu departamento, o que dá uma maior segurança para a empresa de que ela está fazendo as melhores opções", diz.

Atualmente, a equalização dos custos é justamente uma das principais preocupações da BookPartners, holding que controla a varejista Cia. dos Livros. "É um trabalho constante nosso. Se a empresa não faz uma gestão muito forte dessa área se começa a perder a rédea do negócio", afirma o diretor de operações da companhia, Mauro Azevedo. Segundo ele, apesar dos desafios do momento atual, há de fato uma oportunidade grande de se ganhar mercado. "Temos que encarar a dificuldade e tentar obter oportunidades dessa situação, porque com certeza alguém esta deixando de fazer algo em função da crise. É um momento onde a empresa pode conseguir um diferencial de mercado, que possivelmente não conseguiria antes", diz.

Em relação aos investimentos, por exemplo em expansão, Nascimento, da ESPM, diz que é importante deixá-los prontos, mas que agora não é a hora de colocá-los em execução. "Tem que deixar o plano pronto para quando tiver um cenário menos nebuloso já estar preparado, mas de maneira alguma é o momento de abrir novas lojas ou investir em reformas", afirma.

Felisoni concorda, mas ressalta que a recessão ainda pode perdurar por um bom tempo. "A retomada do crescimento está apenas no plano das hipóteses. Hoje não se tem clareza de quando isso poderá ocorrer. O contexto econômico está ligado ao político, e a situação política, tanto externa como interna, está muito instável. Não sabemos os desdobramentos disso", previu ele em entrevista ao DCI.

Benelli também acredita que a retomada deva demorar. Apesar disso, ele é enfático em sua avaliação: "Não se pode nunca ficar parado. Ficar parado no varejo significa morrer."

 

DCI – Diário Comércio Indústria e Serviços

Deixe um comentário