A tendência da inflação oficial, medida pelo IPCA, é de queda para os próximos dois anos. Alguns analistas esperam que a taxa fique abaixo da meta anual, de 4,5%, pela primeira vez desde que o regime de metas de inflação foi implementado.
Para os economistas da Associação Comercial de São Paulo (ACSP), essa trajetória da inflação abrirá espaço para reduções mais intensas da taxa de juros básica, a Selic, por parte do Banco Central.
Entretanto, dizem os economistas, o que realmente importa para a recuperação da economia é a diminuição dos juros “na ponta”, que são pagos pelos consumidores e empresas.
Há uma associação direta entre a Selic e as demais taxas, já que quanto menor seu nível, mais barata será a concessão do crédito oferecido pelos bancos comerciais a seus clientes.
Os economistas da ACSP observam, porém, que há um descompasso nessa equação. “O que se tem assistido desde o começo do ano é uma diminuição dos juros de várias linhas de crédito, porém, em proporção muito menor do que a observada para a taxa de política monetária.”
O Banco Central tem consciência de que os spreads bancários (diferença entre o que a instituição financeira cobra aos tomadores de crédito e o que paga pelas aplicações) brasileiros são os mais elevados do mundo, e inclusive lançou o programa BC+, cujo objetivo central é a redução desse spread.
De acordo com o próprio Banco Central, o spread elevado é explicado principalmente pela inadimplência, pelos lucros do setor e pelos custos administrativos.
“Por esse motivo, é preciso, em primeiro lugar, garantir a adimplência, a partir de legalizar os descontos com pagamentos em dinheiro, limitar o rotativo do cartão de crédito, aperfeiçoar o cadastro positivo e implementar a duplicata eletrônica.”
Segundo os economistas da ACSP, a redução dos custos administrativos seria alcançada pelo aprimoramento da contratação por meios eletrônicos, pela simplificação das regras do compulsório e pela melhoria da regulação sobre arranjos de pagamentos.
Finalmente, diz a equipe da ACSP, a redução dos juros bancários também passa pelo aumento da concorrência no setor, a partir de tornar o cartão de crédito mais eficiente e barato, e pela limitação da concessão do crédito direcionado, que, por representar operações onerosas para as instituições financeiras, levam estas a cobrar mais pelos créditos livres.
O regulador do sistema financeiro reconhece os problemas do setor. Entretanto, existem duas causas adicionais do spread que, por envolverem o governo, escapam do escopo do programa.
Uma das causas são os impostos diretos (imposto de renda – IR e a contribuição social sobre o lucro líquido – CSLL). “O baixo grau de concorrência do setor bancário termina repassando grande parte desses impostos aos tomadores de crédito.”
A outra é o fato de o país apresentar um dos maiores níveis do mundo de recolhimentos obrigatórios (depósitos compulsórios), que diminuem a quantidade de crédito disponível para ser oferecida a famílias e empresas.
“A existência de mais essa ‘jabuticaba’ da economia brasileira se explica, no fundo, pela necessidade de o governo criar um mercado cativo para financiar seu elevado padrão de gastos”, explicam os economistas da ACSP.
Eles dizem que o Programa BC+ constitui importante reforma microeconômica, que poderá auxiliar na redução das taxas de juros. Porém, a equipe da ACSP enfatiza que, para que sua eficácia seja ainda maior, o governo deveria evitar novos aumentos de carga tributária no setor e reduzir suas despesas e, deste modo, seu grau de endividamento.
“Sem esse esforço conjunto, a redução dos juros enfrentados por famílias e empresas deverá ser mais lenta do que o necessário, atrasando a recuperação da economia e impedindo que a mesma se realize em bases mais sólidas.”
MOEDA, CRÉDITO E INFLAÇÃO
De acordo com o Banco Central, nos últimos 12 meses terminados em janeiro, o crédito à pessoa física continuou crescendo bem menos do que a inflação.
Em fevereiro, o Banco Central voltou a reduzir a taxa básica, mantendo o mesmo ritmo de diminuição de janeiro, enquanto a inflação medida pelo IPCA seguiu desacelerando.
ATIVIDADE ECONÔMICA E EMPREGO
O Produto Interno Bruto (PIB) de 2016 recuou de forma importante, porém com menor intensidade do que no ano anterior. Em janeiro, a produção industrial cresceu em relação ao mesmo mês de 2016, em decorrência da base fraca de comparação e de dispor de dois dias úteis a mais.
No mês de fevereiro, a confiança do consumidor apresentou redução em relação a janeiro.
O desemprego em janeiro continuou aumentando, enquanto a renda auferida no mercado de trabalho (massa de rendimentos) continuou diminuindo, ainda que de forma menos intensa.
A taxa de inadimplência da pessoa física mostrou leve alta em janeiro. Em síntese, os dados disponíveis sugerem, até o momento, que a crise está perdendo força.
Mantido o atual patamar do câmbio, a indústria poderá se recuperar em velocidade maior do que o comércio, que enfrenta um consumidor ainda muito cauteloso e inseguro.
Além disso, o agronegócio, com a safra recorde, contribuirá de forma positiva para a atividade econômica, além de reduzir os preços dos alimentos.
A inflação segue em forte baixa no início de 2017, o que poderá intensificar as próximas reduções dos juros básicos por parte do Banco Central.
FINANÇAS PÚBLICAS
Em janeiro de 2017, o Governo registrou arrecadação superior às despesas não financeiras (superávit primário), devido à maior arrecadação de impostos e contribuições neste período, além de maior controle de despesas.
No acumulado em 12 meses, contudo, houve saldo negativo (déficit) primário, explicado fundamentalmente pelo maior crescimento das despesas do que das receitas do governo Federal.
A perspectiva para o resto do ano é preocupante, pois o déficit primário anual foi subestimado em R$ 58,2 bilhões, na Lei de Orçamento Anual (LOA) de 2017.
Para que não se descumpra a meta, existe o risco de aumento de carga tributária, o que seria péssimo para a recuperação econômica e, portanto, para o próprio comportamento futuro da arrecadação.
Para os economistas da ACSP, o ideal, além de continuar cortando despesas, seria melhorar o uso dos tributos existentes, além de focar sua atuação na obtenção de receitas extraordinárias, decorrentes de nova repatriação de recursos, concessões e privatizações.
De qualquer forma, as expectativas do mercado para o resultado primário anual continuam a prever um déficit acima da meta estabelecida.
SETOR EXTERNO
A contas externas continuam apresentando números favoráveis neste início de ano. O déficit da conta “transações correntes” (soma das exportações menos importações de bens e serviços) recuou, principalmente pelo saldo positivo (superávit) obtido pela transação de mercadorias (balança comercial).
O avanço das vendas externas ocorreu em todos os grupos de mercadorias, destacando-se os embarques de produtos básicos, devido à forte recuperação dos preços internacionais de diversas matérias primas exportadas pelo país, em especial do minério de ferro, de petróleo em bruto e de soja.
Do lado das importações, destaca-se o crescimento de bens intermediários, o que poderia sinalizar o início de uma recuperação da atividade econômica.
A taxa cambial no país continua sendo um fator de preocupação para os empresários. Em fevereiro, o dólar manteve a tendência de queda que se observa desde o ano passado.
Em síntese, os resultados positivos da balança comercial neste ano estão sendo obtidos em função dos aumentos de preços internacionais de várias commodities, que puxaram o crescimento das exportações brasileiras, principalmente para a China.
“Se as cotações desses produtos se mantiverem em níveis elevados e o câmbio não prejudicar as vendas externas de manufaturados, é factível a expectativa de que o saldo da balança comercial atinja o mesmo patamar registrado no ano passado.”
Como ocorre desde 2015, o comércio exterior continua contribuindo para diminuir os efeitos da crise econômica, ao mesmo tempo que reduz o déficit das “transações correntes” do balanço de pagamentos do país.
Diário do Comércio