Responsável por administrar as compras de uma família com nove pessoas, a dona de casa Ana Dias se esforça para conseguir atender à necessidade de todos em meio à alta dos preços. O jeito que encontrou foi apelar para embalagens maiores, cujo custo por unidade é menor que o do tamanho padrão. E as marcas sabem: esse modelo de apresentação dos produtos é mais atraente em períodos de inflação alta e de queda na renda, já que permite ao consumidor manter, ao menos parcialmente, seu poder de compra.
— Faço isso para o que é básico. Papel higiênico, sabão em pó, salgadinhos em pacotes grandes para as crianças, congelados. Tudo que compensa você compra em embalagens maiores — explica Ana.
Segundo a dona de casa, o que é básico é comprado nas lojas de atacado, em que as opções de produtos em embalagem “tamanho família” é maior. O que não dá para estocar, como carnes e verduras, é adquirido em supermercados próximos a sua casa, em Mauá, na Grande São Paulo.
— Comprar tudo em tamanho de embalagem normal não compensa. Sai muito caro. Então, tem que ser tudo no pacotão mesmo para conseguir comprar o que é necessário — explicou.
Dados da consultoria Nielsen mostram que a redução de gastos com entretenimento fora do lar foi adotada por 61% dos consumidores neste ano. Isso significa dizer que seis em cada dez brasileiros estão gastando menos com idas a restaurantes, bares ou cinema. E quando aumenta o consumo em casa, as embalagens “tamanho família” naturalmente crescem na preferência do consumidor. Segundo a Nielsen, para não perderem espaço, as marcas precisam estar atentas a isso e oferecerem, mesmo que temporariamente, algum tipo de redução de preço. Por isso, são cada vez mais comuns nas gôndolas dos supermercados opções como “leve três e pague dois” ou “mais 250 gramas".
OPÇÃO PELO USO DE REFIL
A estratégia, que já era comum em produtos de limpeza, também está sendo usada pela indústria de alimentos para atrair consumidores que estão se esforçando para reduzir os gastos. No caso da Perdigão, a saída foi fazer embalagens entre 1kg e 1,2kg de produtos congelados da marca Assa Fácil, que estão chegando ao mercado agora.
— Pensamos em uma embalagem para atender uma família de quatro pessoas, que não era contemplada pelas opções que estão no mercado. Por outro lado, também queríamos entregar um produto em que o preço por quilo fosse mais interessante. Nesse contexto de crise, a gente sabe que o consumidor está fazendo escolhas para fazer render o que tem na carteira — explicou Cecília Alexandre, gerente da marca Perdigão, afirmando que em algumas regiões a demanda por esse tipo de produto está até acima do esperado.
Mas, como alimento tem data de validade, essas versões de maior quantidade em geral concentram-se em produtos congelados ou em itens menos perecíveis, como biscoitos e salgadinhos. Ainda assim, é possível encontrar esse tipo de oferta em itens como iogurtes. Neste caso, o comprador deve lembrar que o tempo de estocagem é mais curto.
Em produtos para limpeza da casa, esse tipo de embalagem é mais comum. No caso da Omo, uma das marcas da Unilever, é possível encontrar sabão em pó em embalagem de cinco quilos e o líquido na versão de três litros. A ideia é que, ao analisar o preço do litro ou quilo, essa embalagem maior seja mais vantajosa que as versões menores. Já no ano passado a empresa decidiu lançar uma opção refil de um litro.
— É fundamental estar próximo do consumidor e entender em profundidade suas demandas e necessidades levando em consideração diferentes perfis e diferentes cenários macroeconômicos. O modelo de embalagem refil, por exemplo, atende às exigências dos consumidores ao entregar a mesma qualidade dos nossos detergentes líquidos com preços mais baixos em relação à garrafa equivalente — explicou Thais Hagge, diretora de Marketing da área de Cuidados com a Casa da Unilever.
A empresa não revela os dados sobre crescimento da demanda por esse produto “tamanho família”, mas informou que ao oferecer uma gama maior de embalagens, tem conseguido manter o crescimento.
A opção por refil também é explorada por outras marcas, como a Destac, de itens voltados para a limpeza do piso, e pela linha de limpeza da marca Veja.
Alexandre van Beek, responsável pela área de projetos da consultoria GS&AGR Consultores, Gouvêa & Souza, afirma que essa busca por opções mais em conta explica o crescimento não só das embalagens em tamanhos maiores e refis de produtos, mas também dos chamados “atacarejos” (lojas de atacado que também atendem o consumidor comum).
— Essas lojas de atacado atendem hoje melhor o consumidor final. A questão do preço é muito importante e acaba sendo o local para a aquisição de produtos básicos, em que se compra de forma planejada. Vendo isso, as lojas de atacado estão oferecendo uma gama maior de produtos. E, enquanto no supermercado ou hipermercado a embalagem econômica está restrita a alguns itens, no atacado é possível encontrar uma diversidade maior de itens nessa opção mais econômica — explicou Van Beek.
A busca por compras de itens no atacado se reflete nos números do setor. Dados da Associação Brasileira de Atacadistas e Distribuidores (Abad) mostram que o faturamento desse tipo de loja cresceu 12% no ano passado e a expectativa é de uma expansão de dois dígitos também neste ano, apesar da crise. Van Beek lembra que, neste momento de crise, as pessoas acabam dando preferência ao que é mais em conta em detrimento da conveniência.
O Globo